Francisco e Clara de Assis


FRANCISCO DE ASSIS

A vida de São Francisco de Assis foi se projetando sobre os homens de todo o mundo, inquietando grandes e pequenos, sábios e ignorantes, pobres e ricos, homens de vários credos... Se nos perguntamos o segredo de Francisco, simplesmente descobriremos que "levou a sério o Evangelho!" Acreditou na Palavra de Cristo! Entrega-se a Deus com uma confiança de criança. Toma o Evangelho em suas mãos, disposto a convertê-lo em prática. Se para conseguir um tesouro no céu deve vender tudo o que tem e dar aos pobres, é o que ele fará. Se diz que tem que deixar a família, Francisco cumpre essa dura exigência sem vacilação... Jamais desanima...

Essa sua conduta diante do difícil cativa a muitos jovens, porque ele lhes ensina a dar um sentido às dificuldades de cada dia. Esta vivência evangélica possibilita tornar presente o Cristo no dia-a-dia. Toda a sua vida é uma preciosa oferenda que permitirá a Cristo tornar a passar por entre os homens. Oferenda preciosa que também hoje Deus espera de quem sente o desejo de reencarnar Cristo e fazê-lo viver cheio de amor, justiça e paz.

A Regra Franciscana, podemos dizer, é uma cópia do Evangelho. Tudo o que Cristo diz possível de se viver. Cristo é a verdade, e seus mandamentos também são a verdade. À luz de São Francisco precisamos examinar nossa fidelidade ao Evangelho e convertê-lo em norma de nossa vida. A primeira coisa que percebemos é que precisamos voltar à SIMPLICIDADE.

Complicamos demais nossa vida em uma estúpida correria! É preciso que Francisco volte e nos recorde que a simplicidade podará nos trazer felicidade. Precisamos voltar ao AMOR FRATERNAL, dispostos a ver em cada pessoa a imagem de Deus. Uma vida na qual com sincera humildade atuemos convencidos de que viemos para servir... Uma vida na qual realmente os pobres sejam os privilegiados. Quanta necessidade temos dessa disciplina que leva a NEGAR-NOS a nós mesmos, por amor! Uma negação que não busque aplausos ou condecorações, que não pede nada em troca porque sabe que o prêmio é o próprio Deus. E quanta necessidade temos da ORAÇÃO, da meditação, do amor ao silêncio...

Apartar-nos do barulho e retirar-nos para a solidão e ali ficarmos a sós com Deus, recebendo a sua Palavra no coração para voltarmos depois com lucidez e continuarmos a encher de luz os caminhos do mundo. É necessário voltarmos também à SAGRADA ESCRITURA como fazia Francisco: com a disposição do filho que se acerca para ouvir a sabedoria do Pai e se prepara para obedecer sem condições.

Para São Francisco, o TRABALHO é fonte de santificação. É bom insistir no amor ao trabalho porque muitos dos males do mundo e de nossa sociedade tem sua origem na ociosidade, na busca fácil e gananciosa de bens, ou no querer explorar e aproveitar-se do trabalho dos irmãos, principalmente dos mais frágeis. Como precisamos da PAZ! O Evangelho nos ensina a compreender, a perdoar quantas vezes for necessário. Hoje vivemos sob domínio do egoísmo, da inveja, de rancores, indiferenças, da violência cotidiana, guerras... que geram insegurança e desassossegos.

Temos necessidade de maior SOLIDARIEDADE. Cristo nos diz que devemos partilhar o que somos e o que temos sem mesquinhez. Se pelo menos fôssemos desapegados, capazes de dar do nosso tempo livre em favor dos mais necessitados, o cristianismo seria verdadeira solução para muitos problemas. No projeto de vida de Francisco está incluído um profundo respeito pela IGREJA fundada por Cristo.

Ele nos ensina a apartar de nós a critica amarga e destrutiva e a buscar melhores caminhos dentro da Igreja, principalmente pelo testemunho pessoal. Ama a Igreja como Cristo a ama. Sabe que não é perfeita. Sofre com ela, porém confia que em meio a tudo isso está também o bom trigo que cresce. A vida de Francisco foi difícil, como foi a vida de todos aqueles que deixaram marcas que fossem luz na Igreja. Obedecer à voz do amor divino exigiu dele uma séria ruptura com velhos modelos.

Mergulhado no mistério do Evangelho, avança sem olhar para trás. Imprime as idéias do Evangelho em sua mente e em seu coração. Quando fala aos seus seguidores deixa a sensação de que é Cristo mesmo que volta a falar aos homens. Finalmente São Francisco leva a ver Deus em todas as CRIATURAS. Descobre uma mensagem divina em cada partícula da criação. Vai passando pela terra extasiado. Vê Deus em cada detalhe da natureza, e reza: "Louvado sejas, meu Senhor, por todas as tuas criaturas.."

O testemunho de Francisco é um canto de esperando no decorrer dos séculos. Sua vida está nos dizendo que é possível viver o Evangelho até as últimas conseqüências, não por nossas próprias forças, mas mediante esta imersa no coração de Deus que nos leva a dizer como São Paulo: "Já não sou eu quem vive; é Cristo que vive em mim". São Francisco vive assim, obedecendo a Deus, confiando Nele, amando-o. Sabe olhar para além dos sentidos corporais e descobre as riquezas de Deus que lhe chama a atenção, de tal forma que deixa tudo para ir atrás delas e ensinar aos outros a fazer o mesmo.

E no último capitulo de sua Regra, Francisco deixa esta mensagem que hoje queremos fazer como a fonte de onde podemos alimentar uma disposição de viver firmes nesta convicção de que Deus é o mais Importante.


SANTA CLARA - UMA VIDA LUMINOSA

Santa Clara de Assis viveu oitocentos anos atrás e sempre foi bastante conhecida nos ambientes franciscanos. Sabia-se que era uma contemporânea e companheira de São Francisco, fundadora da Segunda Ordem Franciscana, a das Irmãs Clarissas. Nasceu em 1194 e morreu em 1253, na cidade de Assis - Itália, com sessenta anos. Entrou na vida franciscana em 1212, com 18 anos de idade. Foi viver em São Damião, na igrejinha onde São Francisco teve um encontro com Jesus Crucificado. Morreu em 1253. Foi canonizada em 1255.

Sepultada na Igreja de São Jorge, mais tarde ampliada para se transformar na Basílica de Santa Clara, seu corpo foi exumado em 1850. O original da Regra foi reencontrado em 1892. Em 1948, foi declarada padroeira da Televisão. Apesar do recolhimento retirado em que viviam as Irmãs, a fama desse novo tipo de santidade correu o mundo, chegou às famílias ricas tanto quanto às pobres e povoou a Europa de novos eremitérios.

Mesmo mosteiros de outras ordens religiosas passaram inteiros, em poucos anos, para a Ordem das damianitas. Quando Santa Clara morreu, já havia mais de cento e cinqüenta mosteiros. Foi em 1263, dez anos após a morte da fundadora, que as Irmãs passaram a ser chamadas de "Clarissas" A memória - A figura de Santa Clara que ficou para a história envolve diversos episódios bonitos, muitas vezes envoltos na lenda: Que ela teria feito brotar rosas na neve, que teria abençoado pães diante do papa fazendo aparecer uma cruz em cima de cada um; que participou de uma ceia de fogo com São Francisco na Porciúncula, que expulsou um exército de sarracenos levantando uma custódia com o Santíssimo Sacramento diante deles.

Clara, tem aparecido em filmes e livros como uma namorada de São Francisco. Na realidade, os fatos superam a lenda. Só havia, mesmo, uma amizade extraordinária entre eles, que pode ser explicada quando os dois nos apresentem uma espiritualidade que, além de ser riquíssima, é essencialmente a mesma, ainda que cada um deles tenha sua maneira totalmente pessoal de expressar-se.

Eles realmente viveram uma experiência ímpar de Jesus Cristo e souberam encontrar esse mesmo Jesus Cristo um no outro. Como lembrou o Papa João Paulo II em 1982: "Francisco viu a si mesmo na imagem dela, imagem de Cristo, em que via retratada a imagem que devia imitar; via a si mesmo como um irmão, um pobrezinho à imagem da santidade desta esposa autêntica de Cristo em que encontrava a imagem da Esposa perfeitíssima do Espírito Santo, Maria Santíssima".

Quando o Processo de Canonização de Clara foi descoberto, em 1920, é que ficamos conhecedores da forte impressão que essa mulher santa exerceu sobre seus contemporâneos, desde criança. Em primeiro lugar, Clara foi uma mulher extremamente carinhosa. E nunca escondeu isso. Viveu-o como um dom de Deus que ela foi deixando amadurecer.

Ela sempre foi uma mulher que sabia o que queria. Francisco custou a dobrá-la, fazendo com que aceitasse ser a "superiora" da comunidade. Logo que se viu com uma Regra (a beneditina), que não incluía seu ideal de pobreza, pediu um "privilégio" ao papa nesse sentido. Uma grande surpresa em Clara é que ela escreve muito bem. Marcou o que escreveu com uma personalidade que justifica seu nome: ela é clara. Concisa e clara. Nos escritos transparece a mulher expressiva e fina, delicada e amorosa. Escreveu, porque tinha uma experiência de Deus para comunicar. Surpreendentemente alegre e feliz, no meio de uma vida penitente que pode nos espantar, ela tinha que comunicar o dom que recebera.

A DESCOBERTA DAS FONTES

Mas pouca gente sabia que essa mulher tinha um valor transcendente, capaz de trazer novidades para o terceiro milênio. Com a celebração do seu centenário de nascimento, em 1993, vieram à luz muitas publicações e, especialmente, pelo menos entre nós, as Fontes Clarianas . É uma preciosa coleção de documentos do século XIII, em sua maioria, desconhecidos até o princípio do século XX, e ignorados em sua totalidade pelo público.

Para apresentá-las sucintamente, podemos dizer que as Fontes Clarianas dividem-se em três grandes tipos de documentos: os biográficos, os históricos e, a parte mais preciosa, os escritos da própria Santa Clara. Entre seus escritos destacamos: A Regra (Clara foi a primeira mulher a escrever uma Regra na Igreja), O Testamento (onde faz uma recapitulação de sua vida para ressaltar o dom da vocação e mostrar como as Irmãs deviam seguir o caminho que é Jesus Cristo), a Bênção mas principalmente, as Cartas a Inês de Praga: ela demonstra um carinho surpreendente para com essa princesa que poderia ter sido imperatriz mas preferiu ser Irmã Clarissa. Passa-lhe uma experiência espiritual profunda e riquíssima, firmando os mesmos fundamentos de São Francisco mas de uma maneira bem pessoal e original.

A ESPIRITUALIDADE

Santa Clara foi uma verdadeira mestra da vida espiritual. Espiritualidade é uma maneira de viver de acordo com a fé, ou de viver a "vida do espírito". Não é uma ciência nem uma teoria e, por isso, embora trate das coisas de Deus e das coisas da alma, e pressuponha um bom conhecimento vivencial dessas realidades, não se confunde nem com a teologia nem com a psicologia. Para Clara, contemplar é contemplar Jesus. Nós só vemos Deus indiretamente, como em um espelho, e o espelho é Jesus Cristo, Deus feito homem.
Nós amamos Deus, a Glória, mas só conseguimos nos entregar ao esplendor da Glória, aos raios de sua Luz que nos atingem - e o esplendor é Jesus Cristo. Da substância divina, nós só conseguimos viver a sua figura, aquilo tudo que chegou a nós em Jesus Cristo. Jesus Cristo é o objeto total de nossa contemplação. Quando contemplamos, o que entra pelos nossos olhos, os olhos do corpo e os olhos do espírito, é Jesus Cristo.

RENOVAÇÃO A PARTIR DO FEMININO

Quando lemos Santa Clara, temos, ao mesmo tempo, a sensação de encontrar algo muito antigo e jubilosamente novo. Porque ela diz o mesmo que foi dito por São Francisco, mas de uma maneira pessoal. A gente encontra o mesmo Jesus Cristo Pobre e Crucificado,o mesmo Irmão,o mesmo Esposo,o mesmo Amigo. mas a apresentação é original. Clara ensina a espiritualidade franciscana de um outro ângulo.

E essa sua visão feminina chama a nossa atenção porque, neste final de século, todos, homens e mulheres, nos sentimos carentes de um feminino válido e profundo, que a nossa cultura ocidental ignorou, impediu, e parece mesmo ter perdido. Nós nos sentimos isolados pelo individualismo e pelo subjetivismo, somos ilha no meio do povo e da multidão. Quando falamos em povo, não temos mais o calor humano da familiaridade, porque a palavra virou uma expressão fria da ideologia.

Como é importante voltar a poder encontrar um povo família, em que nos sintamos alguém! Por isso nos encantamos ao ouvir Clara falando em Jesus Cristo e em nossas mínimas realidades de uma forma tão humana, tão quente, tão feminina. É desse feminino que estamos precisando. Francisco encanta a humanidade por ser um homem que equilibrou o feminino. Clara, por ser uma mulher que equilibra o masculino. Como ele deu ternura à força dos grandes homens, ela deu vigor a sabedoria das mulheres plenas.

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